"Mas, ao chegar a Seteais (...) Iam ambos caminhando por uma das alamedas laterais, verde e fresca, de uma paz religiosa, como um claustro feito de folhagem. O terreiro estava deserto; a erva que o cobria crescia ao abandono, toda estrelada de botões de ouro brilhando ao sol e de malmequerzinhos brancos. Nenhuma folha se movia: através da ramaria ligeira o Sol atirava molhos de raios de ouro. (...)
Quando passaram o arco, encontraram Carlos sentado num dos bancos de pedra (...) Endireitou-se logo, já toda a emoção o deixara, mostrava os maus dentes num sorriso amigo, e exclamou, apontando para o arco:
O maestro embasbacou. No vão do arco, como dentro de uma pesada moldura de pedra, brilhava, à luz rica da tarde, um quadro maravilhoso, de uma composição quase fantástica, como a ilustração de uma bela lenda de cavalaria e de amor. Era no primeiro plano o terreiro, deserto e verdejando, todo salpicado de botões amarelos; ao fundo, o renque cerrado de antigas árvores, com hera nos troncos, fazendo ao longo da grade uma muralha de folhagem reluzente; e emergindo abruptamente dessa copada linha de bosque assoalhado, subia no pleno resplendor do dia, destacando vigorosamente num relevo nítido sobre o fundo do céu azul-claro, o cume airoso da serra, toda cor de violeta-escura, coroada pelo Palácio da Pena, romântico e solitário no alto, com o seu parque sombrio aos pés, a torre esbelta perdida no ar, e as cúpulas brilhando ao sol como se fossem feitas de ouro..."
Eça de Queiroz, Os Maias, cap. VII
Foto de: Vasco Pereira
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